Minha mini-saia fez mais História que as suas bolas.

Ontem tomei banho após um longo dia de trabalho e vesti a roupa que eu tinha na bolsa. Já estava fora de casa, era sexta-feira. Me vi de short. Deixei a preguiça de lado, desci a ladeira, fui em casa colocar uma saia, uma mini-saia. Adoro saia, decote, roupas curtas… Sou totalmente bem resolvida com o meu corpo. A escolhida, foi uma linda saia bem rodada e super curta, o dia merecia. Afinal, foi na manhã da última sexta-feira que recebemos o resultado de uma pesquisa que mostra que 65% da população brasileira acredita que as mulheres que se vestem mostrando demais o corpo merecem ser atacadas e que se as mulheres se ~comportassem melhor~ não seriam estupradas. É O QUÊ??? O machismo cuspiu na nossa cara mais uma vez.
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É óbvio que a saia curta mais um body com as costas nuas, chamaram a atenção, a ideia era essa. Mas isso, meus queridos e queridas, não é uma autorização para que se desfrute do meu corpo. Leia bem, MEU corpo. Levo numa boa os approachs simpáticos, educados e até os engraçados, sou de regra uma pessoa flexível e receptiva, tiro por menos. Mas não me agarre sem a minha permissão, não puxe o meu cabelo, não bloqueie o meu caminho, NÃO ME INVADA!!! Mesmo com a maioria de elogios gentis, dois tristes casos. Um cara que segurou a minha cintura e depois me seguiu até o bar proferindo um grosseiro “gostosa” e uma menina que comentou com a amiga “Precisa sair de casa nua assim?”. Não, queridinha, não preciso, mas tenho esse direito e me visto do jeito que eu quiser. Se tá te incomodando, o problema tá em você.

O COMPRIMENTO DA MINHA SAIA E O TAMANHO DO MEU DECOTE QUEM DECIDE SOU EU!!!

Essa mesma saia tem uma outra ótima história. Ano passado, no natal, eu estava num jantar com muitas mulheres e, exceto a minha tia (que é arretada, desenrolada, descolada e cuca fresca), TODAS falaram mal do seu comprimento e me coagiram a tirá-la antes de sair para a festa. Vale comentar que dentre elas haviam feministas clássicas de movimentos sociais e jovens moderninhas (PASMEM!). Eu que não perco uma única oportunidade de fazer discursos sarcásticos sobre o feminismo em que acredito, atirei “Que belas feministas são vocês. Lutam pelas calças, mas não lutam pela mini-saia? Como assim? Qual o problema da minha saia? Provocativa demais? Ofensiva demais? Vulgar demais?” então ouvi “Mas quase dá para ver a sua calcinha” e retruquei “Ainda bem que é a MINHA calcinha, né?! Eu cuido da minha, você da sua”. Lembro bem que vi por todos os meus 27 anos, minha mãe usar vestidos, saias e shorts bem curtos, ela arrasa. Ia pro centro da cidade com seus lindos vestidos estampados e esvoaçantes (tô cada dia mais parecida com ela) e ouvia de um tudo. Se sentia invadida? Certamente. Mas sabia que o problema não tava nela, estava em que se ofendia ou se sentia com algum direito diante daquele belo par de pernas grossas e bronzeadas.

Já que este é um blog ~de moda~ vamos falar um pouco da mini-saia e sua importância histórica.

 

Após muitas décadas de saias abaixo do joelho, nos anos 60 as mulheres conquistaram os comprimentos no meio da coxa. Vamos falar a verdade… é mais prático, confortável, bonito e bem mais fresquinho. Tudo começou quando a estilista Mary Quant passou a tesoura nos vestidos da modelo Twiggy para um editorial de moda. Mary não poderia imaginar como aquilo repercutiria e Twiggy certamente não supunha que esse fato a alçaria ao posto de uma das modelos mais importantes da História da Moda. Alguns contestam e dizem que foi o designer francês Andre Courreges o seu inventor, mas a estilista
Inglesa disparava “A verdade, porém, é um pouco diferente: Nem eu, nem Courreges tivemos a ideia da mini-saia. Foi a rua que a inventou”. A polêmica, controversa e tão desejada peça do guarda-roupa feminino foi um pedido das ruas, ou melhor, das mulheres, quase como uma alforria. Coco Chanel, que naquela época já era uma senhora, fez campanha a favor da volta da saia longa. Como disse o próprio Karl Lagerfeld (hoje estilista da Chanel), “ela tinha perdido o fio da moda”. Já não havia como brigar, as minis tinham invadido todas as classes sociais e se espalhavam pelo mundo, tornando-se símbolos de algumas estrelas como Brigitti Bardot e a própria Twiggy.

Alguns anos depois a Maison Dior, na minha opinião sempre retrógrada, voltou a criar modelos de saia midi de cintura marcada e muito volume, o que gerou uma grande mobilização feminina nas portas da maison com cartazes e placas que pediam pra que o estilista não assassinasse a mini saia. O comprimento mini foi proíbido em diversos lugares e é considerado inadequado em ~ambientes de trabalho~ apenas um reflexo do machismo ainda instaurado na nossa sociedade. Aqui no Brasil, as mini saias marcaram o período da ditadura militar, quando jovens estudantes de movimentos sociais iam às ruas com suas pernas de fora lutar por liberdade, pela democracia, por um país mais justo e menos excludente.
Em poucas linhas dá pra contar um montão de histórias da mini-saia que fazem parte da História. Em pleno século XXI precisar medir o comprimento da saia ou do decote para não ser atacada na rua não é absurdo, é inaceitável. Não podemos nos entregar a esse moralismo, a esse machismo ridículo e estúpido. É como se entregar a violência e não, se proteger dela.

marcha-das-vadias-cartazesSobre a pesquisa, o que dizer? Prefiro acreditar que esse pensamento surreal seja reflexo de um país com educação ainda em desenvolvimento. De uma população que passou séculos sendo educada para defender princípios moralistas, fascistas, machistas, racistas, homofóbicos, elitistas, excludentes e preconceituosos. Mas tenho fé na informação, no posicionamento político, nos movimentos sociais, nas políticas públicas e nos Direitos Humanos. Por isso, eu não desisto, eu vou sempre falar, reclamar, alarmar, tocar nas feridas, me mobilizar e levantar as bandeiras feministas. Não seriam os estupradores que deveriam se COMPORTAR MELHOR???

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